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  • Foto do escritorRicardo Kalil Lage

Crédito e Banco. Conceitos e Repercussões Práticas na Advocacia

Atualizado: 21 de fev.



CRÉDITO E BANCO. CONCEITOS E REPERCUSSÕES PRÁTICAS NA ADVOCACIA


1 – Crédito


A palavra crédito tem origem no latim “creditum” de “credere”, que significa confiança. É a matéria prima da atividade bancária, transferindo bens ou capital de quem possui para quem deseja ou necessita.


No decorrer dos tempos as operações de crédito desempenharam um papel fundamental para o desenvolvimento das sociedades e das nações, sendo por isso considerado elemento criador de riquezas. A evolução da atividade creditícia permitiu que as transações comerciais pudessem ser realizadas sem o emprego do dinheiro, hoje representadas pela circularidade dos títulos de crédito (arts. 887 a 926 do CC).


A taxa de juros, assunto sempre controverso e polêmico, é instrumento de políticas públicas do Executivo, que pratica sua elevação ou baixa, observando a necessidade momentânea da economia. Fazendo políticas públicas com manipulação da taxa de juros o Executivo regula toda a economia nacional: “a balança comercial, o câmbio, as exportações, controlando o consumo para evitar a espiral inflacionária, dentre outras finalidades públicas” (TJSP, Apelação 9129233-53.2007.8.26.0000).


No campo do direito privado inicialmente a utilização de crédito era associada ao exercício de uma atividade profissional ou para suprir a falta de liquidez momentânea. Contudo, o crédito se democratizou, tornando-se essencial no desenvolvimento da vida econômica da maioria das famílias brasileiras, servindo para aquisição da casa própria, garantir o acesso à educação, uso e consumo de bens duráveis, produtos e serviços de tecnologia.


Na dinâmica da sociedade contemporânea caracterizada pelo forte mercado de consumo, o crédito se apresenta como elemento essencial para permitir o acesso do maior número de pessoas e empresas aos mais variados serviços e produtos.


Nos tempos de euforia na economia a tendência é o aumento de negócios, nascendo milhares de novas contratações envolvendo pessoas naturais ou jurídicas. Em momentos de crise econômica a inadimplência aumenta, resultando em expressivo aumento de ações de cobrança ou execução promovidas pelos credores, assim como de ações revisionais ou de consignação em pagamento ajuizadas pelos devedores.


Por isso é necessário conhecer as regras específicas, os detalhes da atividade bancária, pois, os detalhes fazem toda a diferença.


2 - Banco


A prática da atividade bancária é bastante antiga, existindo anotações no Código de Hamurabi, com registros de operações de empréstimo e depósito pelos fenícios, gregos e romanos.


Paulo Maximilian (Contratos Bancários, 2015, p. 4) anota que “conforme se extrai da pesquisa de Fran Martins, o primeiro banco surgido na Europa foi o Banco de Veneza, fundado em 1171 (e que funcionou até 1797), seguido pelos Banco do Giro, Banco de Rialto e Banco de São Jorge”.


Atividade bancária é conceituada de forma clássica como uma “movimentação de crédito bancário, consistente no recebimento do dinheiro de uns, para colocação em mãos de outros” (Lauro Muniz Barreto, 1975, p. 24).


Na definição de Nelson Abrão, banco “é a empresa que, com fundos próprios ou de terceiros, faz da negociação de crédito sua atividade principal” (Curso de Direito Bancário, 1982, p. 13), ou seja, é um estabelecimento comercial que recebe capitais para distribuí-los em operações de crédito.


O conceito legal se encontra no artigo 17 da Lei 4.595/64, que dispõe sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias, considerando instituições financeiras as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros.


O § 1º do art. 18 discrimina quem é alcançado pela lei, por exemplo: cooperativas de crédito, bolsas de valores e pessoas físicas ou jurídicas que exerçam, por conta própria ou de terceiros, atividade relacionada com a compra e venda de ações, realizando nos mercados financeiros e de capitais operações ou serviços de natureza dos executados pelas instituições financeiras.


Muitas pessoas pensam que empresas de factoring são bancos, mas não são, pois desempenham atividades de fomento mercantil de cunho meramente comercial, em que se ajusta a compra de créditos vencíveis, mediante preço certo e ajustado, e com recursos próprios, não sendo caracterizadas como instituições financeiras.


É jurisprudência há muito tempo consolidada do Superior Tribunal de Justiça que essas atividades regulares de fomento mercantil não se amoldam ao conceito legal de banco, “tampouco efetuam operação de mútuo ou captação de recursos de terceiros” (STJ, REsp 938.979-DF, J. 19.06.12).


3 – Poder normativo do Banco Central


O Banco Central do Brasil é uma autarquia federal criada pela Lei 4.595/1964, vinculada ao Ministério da Fazenda, que tem por missão “assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda e um sistema financeiro sólido e eficiente”.


Entre as principais atribuições do Banco Central destacam-se a regulação e a supervisão do Sistema Financeiro Nacional (SFN), a administração do sistema de pagamentos e do meio circulante, assim como a condução das políticas monetária, cambial, de crédito e de relações financeiras com o exterior.


O Banco Central torna públicas as Resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN), que regulam o exercício da atividade bancária estabelecendo normas que devem ser cumpridas pelas instituições integrantes do SFN.


Importante ressaltar que o relacionamento financeiro do Banco Central é unicamente com as instituições financeiras, pois não se trata de um banco comercial, não oferecendo empréstimos ou financiamentos ao público em geral.


O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência firmada reconhecendo que o Banco Central tem competência conferida pelo artigo 10, inciso VIII, da Lei 4.595/1964, para fiscalizar e aplicar penalidades às instituições financeiras, possuindo as normas produzidas pela autoridade regulatória bancária status infralegal, subordinando-se à lei ordinária, pelo critério da hierarquia e, claro, submetida ao controle jurisdicional que pode ser exercido pelo Poder Judiciário.


Contudo, esse controle jurisdicional deve encontrar limites na discricionariedade administrativa em geral, e, em especial, na discricionariedade técnica peculiar da autoridade regulatória, como exemplo, especificamente no âmbito do sistema financeiro, a fixação da meta de juros da economia (SELIC) e a fixação da meta de inflação, decisões eminentemente técnicas, insusceptíveis de controle jurisdicional quanto ao conteúdo.


No âmbito dos recursos repetitivos, foi fixada a premissa sobre o controle jurisdicional das normas da regulação bancária, devendo-se respeitar a discricionariedade técnica conferida pela lei à autoridade regulatória, sem, contudo, chegar ao extremo de negar aplicação ao Código de Defesa do Consumidor (Recursos Especiais 1.578.553-SP; 1.639.320-SP; 1.639.259-SP).


4 – Repercussões práticas no exercício da advocacia


Primeiramente, diga-se que o estudo do direito bancário propicia um grande conhecimento em processo civil, haja vista as repercussões práticas das várias teses firmadas em recursos repetitivos e repercussão geral nos tribunais superiores tratando sobre aspectos de direito material e processual no que diz respeito aos principais contratos e operações bancárias.


Adquirindo conhecimento no direito material e processual o profissional aumentará a segurança jurídica e a probabilidade de êxito em ações judiciais ou negociação extrajudicial de débitos.


Também são íntimas as relações com o direito civil e direito do consumidor. A Lei 14.181/2021, conhecida com Lei do Superendividamento, que promoveu relevantes mudanças no Código de Defesa do Consumidor com o objetivo de aperfeiçoar a oferta do crédito ao consumidor, dispondo sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento.


A regra geral para os bancos é que não existe limite fixado na lei para a cobrança de juros nos contratos, devendo ser utilizada a média de mercado para cada espécie de operação a fim de verificar eventual abuso na fixação da taxa contratual (REsp. Repetitivo 1.061.530/RS, DJ 10/03/2009).


Quem tem conhecimento sobre direito bancário sabe que as empresas de “factoring” não se enquadram no conceito de instituições financeiras, consequentemente, “os juros remuneratórios estão limitados em 12% ao ano, nos termos da Lei de Usura” (STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 40.581/PR, DJe 21/09/2018). A impossibilidade da cobrança de juros pelas empresas de factoring no mesmo patamar das operações realizadas no âmbito do sistema financeiro poderá ocasionar uma diminuição da dívida objeto da operação inadimplida, resultando em repercussão financeira positiva ao devedor e, consequentemente, para seu advogado.


As transformações decorrentes da revolução tecnológica que vivenciamos trouxe novos atores ao Sistema Financeiro Nacional (SFN) e ao Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB), com reflexos em vários setores da economia e do mercado de capitais. O Pagamento Instantâneo (Pix), o Sistema Financeiro Aberto (Open Banking) e as novas Instituições de Pagamentos (IP) são exemplos dessa nova realidade.


Oferecer uma assessoria extrajudicial para análise de contratos bancários é uma ótima oportunidade de incrementar o campo de atuação da advocacia. Se o crédito é tão importante para a sociedade, com uma infinidade de operações realizadas todos os dias, é necessário que a advocacia fique atenta às oportunidades que o mercado e a economia oferecem.


As oportunidades, sempre aparecem, mas é necessário saber identificá-las e, mais importante, estar preparado para aproveitá-las!


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